quarta-feira, 2 de agosto de 2017

UM CONTO PERNAMBUCANO Isaura morava em Salgueiro no estado de Pernambuco. Casada com Sezefredo, que a amava incondicionalmente. Já tinham sete filhos, quando Isaura ficou grávida mais uma vez. Passaram-se sete meses e tudo corria bem com Isaura. Porém, ao entrar no oitavo mês de gestação, começou a sentir fortes dores. O médico examinou-a e não fez um bom prognóstico a Sezefredo. Disse que seria um parto problemático com sérios riscos à vida de sua esposa. Sabendo do que estava acontecendo, Isaura chamou sua irmã Anastácia para lhe fazer um apelo. Como poderia morrer durante o parto, pediu à irmã que cuidasse do bebê, responsabilizando-se por sua vida. E isso somente poderia cessar no dia em que aquela criança encontrasse alguém que a amasse e cuidasse com muito zelo. Em tal momento acabaria o dever imposto pela promessa que Anastácia haveria de fazer naquele instante. E assim tudo se deu: a irmã prometeu atendendo ao pedido de Isaura. Sezefredo não se conformava em perder a esposa que tanto amava. As apreensões do médico se confirmaram. Isaura acabou morrendo no parto de um lindo menino, que recebeu o nome de Anselmo. Sezefredo não conseguia superar o luto. Desenvolveu uma depressão profunda. Desinteressou-se pela vida, abandonando os filhos e sua profissão. Em dois anos, Sezefredo sucumbiu, morrendo de tristeza. Anastácia levou Anselmo para sua casa e cuidou do menino, zelando por sua formação, substituindo a mãe como uma perfeita cuidadora, viabilizando um ambiente em que a criança pôde desenvolver sua boa formação genética. Anselmo cresceu saudável. Com sua personalidade ajustada, quando entrou na idade adulta, resolveu deixar Salgueiro e o nordeste, procurando novos ares a fim de desenvolver as potencialidades que estava consciente de possuir. Foi para Brasília onde trabalhou no Instituto Nacional da Previdência Social. Ali teve boa adaptação como era de se esperar de uma pessoa inteligente, equilibrada e de bom senso. Anselmo vivia sozinho num apartamento, que alugara com ajuda de Anastácia. Comunicava-se com ela seguidamente, pois esta exigia dele que a mantivesse atenta a fim de cumprir o dever objeto da promessa feita a Isaura. Anselmo era a preocupação principal da vida de Anastácia. Certo dia, Anselmo comprou uma revista Cruzeiro para ler em casa. Lá pelas tantas deparou com um setor da revista onde eram publicadas cartas de pessoas que procuravam um amor ou, pelo menos, uma amizade. Era o chat de relacionamento da época. E ali viu uma carta de uma moça de Erechim, no Rio Grande do Sul, que mexeu com seu coração. Não teve dúvida, respondeu a carta da gaúcha e assim iniciou um longo e belo relacionamento de amor e cumplicidade. Araci era descendente de italianos, que não receberam bem aquela forma de começar um relacionamento amoroso. Todavia, Araci, moça de vontade férrea, determinada, não desistiria facilmente. E foi exatamente isso que aconteceu. Anselmo veio a Erechim conhecer Araci pessoalmente. O encontro foi com brilho nos olhos e ritmo cardíaco acelerado. Um sucesso. A família italiana impressionou-se com a educação do rapaz, sua excelente formação moral e profissional. Perfil de um cavalheiro. Anselmo informou Anastácia de tudo que estava a se passar e ela exultou porque já estava na hora dele encontrar uma mulher, que fosse uma boa companheira. Pediu que a levasse a Salgueiro para conhecê-la melhor. Com mais uma ajuda de Anastácia levou Araci para apresentá-la, gozando as duas de longas e prazerosas conversas. Anastácia ficou realizada pela conquista do seu menino. O namoro entre os dois durou mais de um ano, ao fim do qual resolveram casar. As emoções positivas e a afeição mútua eram visíveis naquele relacionamento de duas pessoas que se completavam na expressão de suas personalidades ajustadas e dóceis. Toda a família acompanhava essa vivência que, apesar da distância, fazia prever um matrimônio perfeito. Anastácia, já em idade avançada, ansiava por ver Anselmo realizar sua felicidade projetada. Estava certa de que Araci seria a mulher da vida de seu rapaz amado. Embora não pudesse ir ao casamento mantinha-se informada de tudo. Anselmo e Araci casaram-se para começar uma existência de amor recíproco. Festa simples regada pela alegria do amor sincero. Araci, então, no dia seguinte escreveu uma carta para Anastácia com o propósito de afirmar que Anselmo encontrara a pessoa que, doravante, por ela seria amado e cuidado, agradecendo tudo que Anastácia por ele tinha feito até ali. Anastácia recebeu a carta, enchendo os olhos de lágrimas. Tomou seus livros para distrair-se antes de dormir, como sempre fazia. Logo após, pegou os livros e a carta colocando-os à cabeceira do leito. Adormeceu. E, ao amanhecer, quando a vizinha veio vê-la, encontrou-a morta com um sorriso nos lábios. Anastácia resolvera que era hora de partir a fim de informar Isaura que sua promessa havia sido cumprida.

Um comentário:

  1. Lindo , poético . Um conto inesperado !
    Gostei muitíssimo.
    Solange

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