quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Uma jóia chamada André

Meu querido André. Daquelas pessoas que tem todas as cores na alma.
É bom quando o vento traz a brisa refrescante em tardes quentes. Já deve ter acontecido isso com o leitor desta página. Você está triste e sem esperança. Mas ao dobrar uma esquina topa com um amigo que lhe dá um livro do Sêneca e lhe indica o início da obra do estoico romano: "Procede deste modo, caro Lucílio: reclama o direito de dispores de ti, concentra e aproveita todo o tempo que até agora te era roubado, te era subtraído, que te fugia das mãos."
Pois o André, que tem a fina inteligência da ironia e do humor, é um artista. De dentro. Genuíno ator, com máscara e tudo. Do bem e da alegria. Não fuma e bebe pouco. Apesar disso, encantador.
Contou-me uma curiosidade de sua trajetória que não posso deixar de relatar aos amigos.
Num teatro carioca desenvolvia-se uma peça teatral. Um velho abandonado ( o André), um cachorro cuja missão única era zelar pela segurança do idoso (um ator que voltara à cena, depois de algum tempo) e um lobo que espreitava a casa (não era um lobo, era um artista, mas esse eu não sei quem era), aguardando o momento oportuno para adentrar e comer o velhinho indefeso.
A plateia, lotada de crianças com seus pais, vivenciava a angústia do velho, que percebia o lobo aproximar-se.
Abre-se a porta com aquela mão peluda surgindo e o pobre homem começa a tremer. O cão, ao invés de cumprir o seu dever, dorme a sono solto. Grande tensão no ar. Transição angustiante. E o cachorro segue dormindo alheio a tudo. O lobo invade, aproxima-se e o velho geme. A morte se aproxima. Dos dentes do animal saltam as gotas que antecipam o prazer do jantar.
Todo o teatro treme. Unhas roidas. Mãos nos olhos. Pais abraçados aos filhos, lívidos.
Nisso, um baixinho retaco, de uns cinco anos, não suporta. Pula de sua cadeira, avança sobre o palco, aproxima-se do cão, e dispara: "acorda, seu cachorro filho da puta!"
Risada geral. Roubada a cena. Não havia mais como prosseguir.